É preciso discutir a Cargill. Será que alguém vai falar sobre o assunto, durante o processo eleitoral? Conversei com alguns amigos santarenos e eles descreveram a audiência pública acontecida ante-ontem como um “espaço de propaganda” (leia-se o que queriam dizer assim: a tentativa de acobertar verdades e debates por meio de manipulações midiáticas, pessoas pagas para levantar cartazes).
A impressão que meus amigos tiveram foi de que a Secretaria de Estado do meio Ambiente tem fortes interesses em resolver a questão favoravelmente à Cargill. Meus amigos são petistas. Fazem parte do governo e defendem o governo. O que não defendem são os interesses financeiros e políticos que, à pretexto da positivação do cenário eleitoral, aceitam fazer negócios em torno de posições partidárias históricas. Não sei se é o caso, mas é sempre bom colocar o debate no plano público e convidar os agentes sociais envolvidos a se posicionarem com clareza sobre ele. Mesmo para que a sociedade possa cobrar-lhes melhor e para que não restem sombras de dúvidas sobre essas coisas.
Quem defende a Cargill? Os ruralistas da região, que se reúnem através do Sirsan e que apoiam atavicamente o deputado federal Lira Maia, do DEM. Quem defende a sociedade? O MPF e o MPE, obviamente, mas é necessário criar um cinturão de fiscalização, bem como, talvez, um cinturão de saneamento da política...
Enfim, seria muito bom saber o que os candidatos e os gestores pensam sobre a questão Cargill. Se desejarem, o blog está aberto para conversar sobre esse assunto.
Como se sabe, a Cargill, empresa graneleira norte-americana, se instalou ilegalmente no Pará, utilizando, para isso, falsos licenciamentos que lhe foram concedidos pelos governos demo-tucanos, que, em 1999, governavam tanto o Pará como Santarém.
A chave da questão é que a empresa não apresentou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), como manda a lei. Durante uma década, a Cargill foi obtendo liminares e adiando a obrigação de apresentar esses estudos.
A instalação da Cargill em Santarém deu início a um processo de avanço predatório da fronteira agrícola do Mato Grosso na direção do município. O resultado é pouco acompanhado pela impressa, que, afinal, não tem interesse em evidenciar a questão, perdendo grandes anunciantes e tensionando relações políticas que, hoje, giram em torno do lobby do agronegócio.
Porém, o resultado repete o ciclo de colonialismo interno que já devastou o sul e o sudeste do Pará e que agora vai tendo lugar ao longo da BR-163, a rodovia Cuiabá-Santarém: destruição ambiental, grilagem de terras, violência no campo. A expansão do agronegócio destrói a floresta e a sociedade.
O governo Lula, como também se sabe, interveio. Produziu o Plano BR163 Sustentável, que destina 6,4 milhões de hectares à implantação de Unidades de Conservação. Além disso, criou o Distrito Florestal do Rio Tapajós (com 16 milhões de hectares), o Sistema Florestal Brasileiro e a Lei de Gestão de Florestas Públicas.
O governo também iniciou a pavimentação da rodovia. O governo do Estado também agilizou a parte que lhe cabia: fez o Zoneamento Ecológico e Econômico do Oeste do Pará e iniciou um importante projeto de organização territorial, da qual fizeram parte ações como a digitalização de acervos cartoriais e a titulação de terras. O governo estadual ainda investiu bastante na agricultura familiar, que gera e distribui riqueza e protege o meio ambiente.
Essas ações encurralam o agronegócio e definem claramente o seu espaço. Porém, há brechas, que vão se abrindo em torno das atividades comerciais do porto da Cargill. Isso tem mudado a face de Santarém: a última década foi de urbanização rápida e de aumento populacional (mais de 50 mil novos habitantes em 10 anos).
Caso o Eia-Rima inexistente seja aprovado, os estragos serão grandes e as perdas já sofridas não serão compensadas.
Quem vai decidir a questão é a Secretaria do Meio Ambiente do Estado. Os Ministérios Públicos Federal e Estadual acompanham, observam, indagam, ouvem a sociedade. Mas quem decide, institucionalmente, é a Sema.
Esperamos que a Sema faça o seu trabalho e que imponha a realização criteriosa do estudo de impacto.
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J.